Em 2021, Devil May Cry completa 20 anos. Fundadora do gênero Stylish Action, a série enfrentou turbulências e decisões questionáveis por parte dos desenvolvedores, mas conseguiu se reerguer e reconquistar os fãs… algumas vezes já.
Combos, referências pop, até provocações dignas de quinta série aos monstros; tudo em Devil May Cry serve o distinto propósito de derrotar os inimigos com personalidade e estilo. Se Dante pode usar uma guitarra como arma, ele vai usá-la.
Quem topa fazer uma viagem até as últimas profundezas do inferno? Calma, calma, é só para relembrar a história dos demônios mais garbo do universo gamer.
Tão preparados?
Devil May Cry (2001)
O primeiro Devil May Cry nasceu do esforço criativo – e incansável – de Hideki Kamiya. Encarregado de comandar mais uma sequência de Resident Evil, o diretor se empolgou um pouquinho e acabou dando poderes sobre-humanos a Leon, protagonista até então, mudando o tom do jogo para a ação pura.
A Capcom enxergou potencial na nova ideia, mas não quis misturá-la com a realidade mais ‘científica’ de Resident Evil. Decidiram, então, transformar o conceito em uma propriedade separada. Daí surgiu Dante: metade humano, metade demônio, protetor da humanidade e piadista.
Dante é um herói cheio de personalidade e carisma, provocando os adversários, trazendo leveza à história e o mais importante: convidando o jogador para a diversão.
Devil May Cry quer que a gente seja tão descolado e habilidoso quanto o seu herói. Para isso, o jogo adota uma abordagem, digamos, sem piedade. Os monstros enfrentados por Dante são brutais, alguns com uma dúzia de golpes, e mesmo os inimigos mais básicos não são despachados sem estudo e estratégia. Ao final de cada missão, o jogador tem sua performance avaliada através de um rigoroso sistema de ranking.
Mas a recompensa vale o esforço. Devil May Cry é um dos jogos de ação mais gratificantes de sua era, combinando luta com espada, socos e armas de tiro na mesma proporção. Dante pode jogar um monstro para o alto e mantê-lo no ar com tiros de pistola, ou desviar dos inimigos com destreza e contra-atacar na melhor chance.
O combate ainda não tinha toda aquela liberdade que passou a caracterizar a série, mas dentro de suas limitações, o original fez um trabalho espetacular.
Devil May Cry 2 (2003)
Uma sequência seria inevitável, né? Sucesso de crítica, vendas e tudo mais, potencial de evolução, a moral de ter fundado um novo gênero. A Capcom não deixaria passar a oportunidade, e não deixou.
Mas o resultado, infelizmente, foi um desastre.
Devil May Cry 2 teve um processo complicado de desenvolvimento, com troca de comando na equipe, prazo curto e uma necessidade sem sentido de deixar tudo maior que o precursor.
Nisso, perdeu-se o equilíbrio do gameplay original, bem como a física e o desafio. A ação e os diálogos são entediantes e arrastados. As fases realmente são maiores, mas sem conteúdo para preencher todo aquele espaço, resultando em arenas vazias e banais. Alguém aí quer atirar num tanque de guerra por doze minutos seguidos em uma longa avenida? Iêi.
Ah, Devil May Cry 2 também apresentou Lucia como co-protagonista. Coitada, nem sobrou muita coisa pra falar dela. Seus golpes são ligeiramente diferentes, mas nada especial.
Foi um jogo para esquecer.
Devil May Cry 3: Dante’s Awakening (2005)
Sem dúvida, a grande obra-prima do gênero. Depois de uma excelente introdução e de uma sequência que pelamordedeus, essa prequel finalmente estabeleceu a identidade do gameplay que conhecemos até hoje, alinhando o sistema de combate até o ponto certo.
A barra Style, parte integral do gameplay, fica o tempo todo de olho na repetição dos golpes. Repetir repetições repetidas tira pontos do ranking final.
Mas sério, o objetivo é variar os golpes e estimular a criatividade. Para isso, o jogo oferece um repertório considerável: cinco armas de tiro, cinco de mão – incluindo um nunchaku e, sim, a famosa guitarra –, além dos novos Styles, estilos de luta que abrem um leque de opções relacionadas a defesa, movimento e armas.
Como se não bastasse, Devil May Cry 3 ainda conta uma história excepcional para os padrões do gênero. A narrativa é eficaz, os personagens bem desenvolvidos, e a mitologia é expandida a partir do ponto de vista de um jovem e (mais) imaturo Dante.
Devil May Cry 4 (2008)
Nero, a nova estrela da praça, chega com um modo de luta diferente, mas igualmente divertido. O braço direito de Nero, o Devil Bringer, puxa inimigos para perto, manda o próprio herói para longe, ou agarra o inimigo e desfere um golpe especial.
Além do Devil Bringer, Nero usa uma espada acoplada a um guidão de moto – exatamente o que você leu! – e que tem o poder de ‘acelerar’ energia e causar maior dano.
Nero oferece uma dinâmica interessante ao combate, priorizando combos mais fluidos e quase sem intervalo entre os golpes. E se você prefere Dante, ele participa da festa também, é claro. Mas… é aí que reside o maior problema do jogo.
O design de fases em Devil May Cry 4 lembra Silent Hill 4, que cobrimos na retrospectiva anterior. Na metade da aventura, somos obrigados a fazer um cavalinho de pau e voltar até a primeira área do jogo pelo caminho inverso. Qual é, Capcom, acabou a grana no meio do trampo?
Sim, a metade derradeira nos coloca no controle de Dante, que tem suas próprias habilidades, mas o formato de bate-volta continua sendo escancarado e preguiçoso. E fica pior considerando que reencontramos os chefes em ordem reversa, o que os torna cada vez mais fáceis, ironicamente.
Dito isso, Devil May Cry 4 é uma ótima experiência, com gráficos primorosos e combate cada vez mais refinado.
DmC (2013)
O problema nessa tentativa frustrada de reboot foi o claro descaso com a história da franquia e, pior, com os fãs. Ninja Theory, estúdio responsável pelo jogo, parece ter sido informado de que Devil May Cry era um fracasso ressonante, sendo eles os verdadeiros gênios que salvariam todos nós do marasmo das versões anteriores.
Dante, apelidado Donte (haha) pela comunidade, agora vive em uma realidade punk rock, sem um fio de cabelo branco. Sua cidade, Limbo, é comandada por demônios engravatados que, aparentemente, manipulam a sociedade como bem entendem. Uau, a audácia.
O roteiro é pretensioso do início ao fim, passando mensagens sem sutileza alguma – não, sério, às vezes as palavras pulam na tela! – e cutucando o público como quem diz ‘pode confessar, você não gosta realmente daqueles jogos ultrapassados, né?’. Aliás, em certo momento, uma peruca branca cai por cima da cabeça de Dante, que a despreza e joga fora. Ai, ai.
Sabem a pior parte disso tudo? DmC não é um jogo ruim – é bom. A mecânica de poderes Angel e Devil é envolvente, o combate aéreo é dos mais viciantes do gênero, o design de missões flui bem, e o visual transita entre o mundo moderno e as belas vistas sobrenaturais com elegância.
Uma pena. Não fossem as decisões malucas de apresentação e temática, esta seria considerada uma adição perfeitamente sólida ao universo Devil May Cry.
Devil May Cry V (2019)
A saga de Dante continua após o fim do quarto jogo. Reboot? Que reboot? A Capcom basicamente tapou os olhos e fingiu que não havia acontecido nada.
E fez bem.
Urizen, um lorde infernal que não parece precisar de muito mais na vida, resolve espalhar raízes de uma árvore demoníaca pela Terra a fim de se tornar ainda mais poderoso. A trama tem várias reviravoltas surpreendentes que fazem jus à mitologia construída até ali.
Não demora muito pra ficar clara a escolha pelo 5 romano no título: Dante e Nero agora dividem os holofotes com V, mais novo protagonista da série. V não tem a mecânica tão aprofundada quanto a dos dois colegas, o que talvez seja o pecado capital de Devil May Cry V.
V está em condições frágeis demais para lutar, optando por invocar monstros do primeiro Devil May Cry – Shadow, Griffon e Nightmare – que fazem o trabalho pelo jovem.
O combate com V lembra aquela ideia estereotipada que algumas pessoas têm sobre videogames, de martelar os botões sem ritmo ou timing até ‘vencer’. É mais ou menos isso que acontece.
As arenas também são um pouco repetitivas. Chega uma hora que cansa ver tantas raízes escuras num céu cinzento.
Apesar dos tropeços, Devil May Cry V é bem sucedido onde realmente importa: na ação e complexidade do sistema de combate. Com Dante e Nero, ao menos.
E agora, pra onde será que vai a próxima sequência? A história vai continuar sendo expandida, ou será que vamos ter que aguentar mais um reboot prepotente? Comente aí pra nós o seu Devil May Cry favorito!
Até mais!